Caro Professor Marcelo Rebelo de Sousa,
"Se há cidade onde não faz sentido defender a bicicleta com as sete colinas é Lisboa. (...)
Andar de bicicleta em Lisboa, teoricamente é impossível (...)".
Como também já afirmou, é infelizmente habitual em Portugal haver quem fale de tudo, inclusivamente do que não sabe. Admito que sobre este assunto não saiba que não sabe. No entanto ao fazer esta afirmação está por em perigo os ciclistas que existem em Lisboa, não encoraja a forma de transporte mais eficiente que existe em termos energéticos e ocupação de espaço, desacredita para Lisboa um modo de transporte que não contribui para a emissão dos Gases de Efeito de Estufa, não contribui para as centenas de mortos e feridos que acontecem todos os anos na cidade mas contribui para a saúde de quem usa e quem não usa.
Existem muitos Lisboetas que usam a bicicleta como meio de transporte diário e habitual, tal como é normal em muitas cidades da União Europeia e não só nos países planos do Norte. Lisboetas que desafiam quotidianamente a "impossibilidade teórica" de que falou e que a partir de agora passarão a sofrer de uma grave crise existencialista. Se o Sr. Professor tiver por habito andar de carro pela cidade, admito que nunca tenha reparado que as Avenidas Novas são um imenso planalto que se estende até às novas urbanizações da Alta de Lisboa, que as margens do rio Tejo são planas e que é perfeitamente possível, com as bicicletas actuais, usar os vales e as cumeadas de Lisboa para chegar a qualquer sítio. Bairros como Campo de Ourique, Alvalade, Arco do Cego, etc. são perfeitamente cicláveis por qualquer pessoa, seja qual for a sua condição física. O perigo relativo são os automóveis - só nos faltava agora comentaristas a "ajudar". Entre os vales e cumeadas deveria a Carris, uma empresa pública que não lhe deveria dar ouvidos, proporcionar formas confortáveis de transportar as bicicletas dentro ou fora dos seus veículos e elevadores - como aliás é normal em muitas cidades da Europa. Em todos estes percursos, deveriam os candidatos à Câmara de Lisboa, que não lhe deveriam dar ouvidos, actuar de forma a criar condições de circulação seguras para todos os modos de transporte.
Poderá não saber, mas a bicicleta hoje já não pode ser tomada como um instrumento lúdico e recreativo, mas sim um modo de transporte urbano que precisa ser promovido como alternativa. Este facto é claramente postulado pela União Europeia que tem agora competência normativa em políticas de transporte. No entanto, a própria Comissão reconhece que o seu ponto de vista é infelizmente frequente entre quem decide – com o álibi da orografia ou outros, a bicicleta “é demasiadas vezes negligenciada como modo de transporte, embora 50 milhões de viagens (isto é, 5% do total) sejam feitas diariamente em bicicleta em toda a Europa", afirma um documento recente da Comunidade Europeia. Felizmente existe em toda a Europa uma preocupação em fomentar o uso da bicicleta tanto por razões urbanísticas, ambientais ou simplesmente para a promoção da saúde pública. Neste último aspecto, salienta-se que no caso de Portugal ainda há um grande caminho a percorrer e o Sr. Professor não ajudou a fazer caminho. Antes pelo contrário.
Por vezes não é necessário atirarmo-nos ao Tejo para meter água. Acontece a qualquer um que se aventure por águas que não conhece. Aproveito para o convidar a participar todas as últimas Sextas-feiras de cada mes na Massa Critica - uma coincidência organizada de bicicletas que se realiza em centenas de cidades em todo o mundo. É no Marquês do Pombal às 18:00 horas. Apesar de tudo, tenho a certeza gostará do ambiente festivo e será muito bem recebido.
Mário J. Alves